14/06/2012

Banquete na Roça, consumo consciente e a Rio+20

Em dias de reflexão sobre o meio ambiente, quando a nossa cidade é mais uma vez sede da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, vale citar algumas ações pontuais por parte da sociedade civil que visam a transformação das circunstâncias que ora testemunhamos, quando a degradação do meio em que vivemos se evidencia a cada dia, mediante um nível de consumo que não se sustentará nos próximos anos.
Como membro do Instituto Maniva,  uma OSCIP formada por Ecochefs que utilizam a gastronomia como instrumento de transformação socioambiental, tornou-se ainda mais enfático em minha vida profissional os debates sobre o consumo consciente e a importância da produção agrícola saudável.
Em meus estudos sobre azeites, procuro ressaltar o caráter sensorial desse precioso ingrediente, presente apenas naqueles que são produzidos cuidadosa e criteriosamente, pois costumo dizer que a azeitona é a expressão máxima da essência de um terroir, aliada à dedicação e amor daquele que a produz, sendo o azeite extra virgem a sua tradução.  
Desta forma, nada mais adequado do que associar  esse óleo sagrado, alimento ancestral da humanidade aos acordos que as Nações estão se esforçando para assinar em conjunto e que, nós cariocas e brasileiros estamos testemunhando in loco, como uma oportunidade única de sermos os protagonistas de ações históricas que mudarão definitivamente o panorama do consumo para as futuras gerações.
Com isso em mente, no próximo dia 24 de junho, os Ecochefs Maniva promoverão o Banquete na Roça, no distrito de Amparo em Nova Friburgo, região devastada pelas chuvas em janeiro de 2011, quando cerca de 780 famílias rurais perderam tudo.  
“Frente a esta realidade, mostra-se fundamental o conhecimento e a participação civil na reconstrução deste belíssimo patrimônio, principalmente pelo fato de o Rio de Janeiro ser o seu maior mercado consumidor”, afirma o Ecochef Joca Mesquita.
O projeto pretende mapear os produtores da Região Serrana, seus produtos e sazonalidades. Segundo a presidente do Maniva,  a Ecochef Teresa Corção, "a ideia do evento é estimular a venda de alimentos orgânicos, melhorar a qualidade de vida e o bem-estar dos agricultores familiares e dos consumidores".
O Banquete acontecerá no sítio Flor de Nova Friburgo em parceria com o Grupo de Orgânicos da Serra.  O produtor Flavio Jandre e sua família, proprietários do sítio, estão motivados com a ação.  Ele acredita que esse movimento difundirá a agricultura orgânica ao mostrar que é possível viver da própria produção.  "Queremos que mais pessoas se interessem pela produção orgânica e valorizem o nosso trabalho" - afirma.
Como não poderia deixar de ser, como Ecochef especialista em azeites, terei a honra de apresentar aos convidados do banquete o primeiro azeite paulista 100% brasileiro, produzido na Fazenda Ronco D'Água no município de Silveiras, fruto da corajosa iniciativa de dois empreendedores, Aníbal Cury e Dominique Pierre Faga. 
Um jovem olival, localizado a 1.200 mts de altitude e 237 km da cidade do Rio de Janeiro produziu o azeite da Serra da Bocaina, cuja variedade arbequina apresenta um frutado leve e um frescor únicos, conferindo-lhe personalidade e possuindo todo o potencial para se desenvolver como um bom azeite gourmet.
A origem dos alimentos precisa ser repensada, cuidada, pois dela depende o nosso futuro.  Os debates que nesse momento ocorrem não devem cessar no dia 24.  Independentemente das decisões políticas, precisamos agir para conscientizar um número cada vez maior de pessoas sobre a interdependência entre todos os seres, como a bela metáfora da rede de Indra que explica a interligação da vida.
"Consta que o palácio do deus Shakra Devanan Indra, que representa o poder da natureza, é coberto por enorme rede ornamentada com incontáveis gemas que cintilam em muitas cores diferentes.  Não há nenhuma pedra no centro da rede; cada uma delas fica igualmente no centro do todo.  E cada gema reflete as outras gemas, fazendo-as brilhar com todo esplendor e criando um mundo magnífico e perfeitamente harmonioso".  
Assim somos nós, cada um como um nó numa teia infinita de relações mútuas.

 Os Ecochefs Teresa Corção, Ana Ribeiro, Joca Mesquita e eu
 A Fazenda Ronco D'Água e seu jovem olival

 O primeiro azeite paulista 100% brasileiro

A Rede de Indra




04/06/2012

Azeites de oliva, um mundo a se descobrir...


Todo esse tempo sem escrever deveu-se a um único motivo, minha preparação pessoal para uma viagem há muito tempo objetivada para um curso de degustador profissional com a chancela de um organismo internacional filiado ao Conselho Oleícola Internacional e foi a Espanha quem me acolheu na região de maior produção mundial, a Andaluzia.
A convite da especialista no assunto, Sra. Brígida Jimenez, diretora do IFAPA (Instituto de Investigación y Formación Agraria y Pesquera) embarquei para Madrid no último dia 24 de maio em companhia de minha amada amiga Maria Elisa Berredo, escritora e roteirista de incomparável talento e sensibilidade, responsável pela inclusão do azeite na trama da última novela das 21hs da Rede Globo de Televisão, Fina Estampa. 
Após um curto final de semana na capital espanhola para iniciar minha adaptação ao horário, clima, aromas e sabores deste maravilhoso e diversificado país, iniciamos nossa viagem a bordo de um pequeno e confortável VW Golf, cruzando os infindáveis olivais do interior da Espanha, iniciando pela província de Toledo, cruzando a região de Castilla y La Mancha, até chegar a Cabra, zona rural da província de Córdoba, cenário perfeito para o curso de 28 horas em 4 dias, mergulhado entre as oliveiras, em plena primavera ibérica, quando as flores dessa sábia árvore desabrocham em plenitude...
No clima seco e árido, a monocultura olivareira pontilha as montanhas e planícies de um verde prata inigualável, fazendo da paisagem andaluza um retrato significativo da produção mundial que demanda cada vez mais desse produto agrícola tão valioso.
A experiência foi incomparável... não há outra maneira de sedimentar meu conhecimento que não seja aprofundando minhas percepções sensoriais para poder construir um discernimento com referências de valor reconhecidas por experts com longa vivência e cultura.  E assim foi...
Três seções de 5 rótulos por dia, totalizaram 60 degustações, com reconhecimento de atributos positivos e defeitos que reiteraram e ampliaram meu conhecimento, tornando-me mais apto a transmitir o verdadeiro valor de um extra virgem, ainda muito pouco conhecido em nosso país. 
A produção e valorização de azeites extra-virgens encontra-se em uma novíssima etapa não só no Brasil, mas também nas principais regiões produtoras e consumidoras do mundo.  A Espanha, maior produtor mundial com 1.200.000 toneladas (dados aproximados) está atualmente empenhada em melhorar a qualidade de sua produção, através de intensa campanha educacional junto aos produtores, conscientizando-os sobre a importância de todos os processos que influenciam nas percepções sensoriais do produto final.  O panorama espanhol se transforma com relativa velocidade, quando azeites artesanais de origem ingressam no mercado e o próprio consumidor inicia a fazer seu discernimento, conhecendo os produtos, suas variedades e seu correto uso.
O Brasil também segue rumo próprio. Inicia orgulhosamente a produzir no sul e sudeste do país e seu consumo será regularizado com a primeira instrução normativa  que entrará em vigor no segundo semestre deste ano. Produtos de qualidade aos poucos entram em nosso mercado e, com este conhecimento, poderemos fazer nossas próprias escolhas.
Minha paixão pelo assunto me conduzirá, comercialmente isento, a colaborar na descoberta desse vasto e fascinante mundo e termino essa postagem com a sabedoria de um verso do poeta espanhol Antonio Machado, “...caminante, no hay camino, se hace camino al andar. Al andar se hace camino y al volver la vista atrás se ve la senda que nunca se ha de volver a pisar. Caminante, no hay camino, sino estelas en la mar."



Maria Elisa Berredo


Azeites de qualidade


Aprendendo...


A paisagem andaluza

Minha mestra Brígida Jimenez