16/12/2013

A análise sensorial do azeite de oliva e a consolidação da qualidade no Brasil

Entre os dias 2 e 6 de dezembro o SENAC Rio ofereceu na unidade Copacabana, o Curso Superior de Análise Sensorial de Azeites de Oliva com a Dra. Brígida Jimenez Herrera, diretora do IFAPA de Cabra (Córdoba) Instituto Andaluz de Investigación y Formación Agraria, Pesquera, Alimentaria y de la Producción Ecologica. Doutora em Farmácia pela Universidade de Granada, com alta especialização em gorduras pelo Instituto de la Grasa, detentora de inúmeros prêmios e distinções pelo seu trabalho inovador em pesquisas sobre esse ancestral alimento, a Dra. Brígida é hoje reconhecida como uma das maiores especialistas mundiais no assunto.

O conteúdo do curso, com carga horária de 20 horas, focou nas percepções organolépticas dos atributos que caracterizam defeitos e qualidades do azeite.  O conhecimento adquirido com tal experiência ajuda a criar o discernimento que leva ao reconhecimento da qualidade do produto e, consequentemente à escolha correta segundo as necessidades de cada um, seja profissional da gastronomia, comerciante, importador, produtor, ou simplesmente um entusiasta do tema. 

Com perfeito domínio e profundo conhecimento, a Dra. Brígida transmitiu de forma objetiva e clara o vasto e complexo mundo sensorial que os azeites possuem e formam durante sua fase de extração, elaboração e conservação.  Foi surpreendente e impactante para todos!

Produzido pela civilização humana há mais de 6.000 anos, considerado místico e sagrado desde a Antiguidade, o azeite de oliva sempre foi obtido de forma relativamente simples, quando o sumo da azeitona era apenas extraído por processo mecânico de prensagem.  Desde os tempos mais remotos até a década de 80 do século passado, a maneira de obtenção pouco mudou.  A partir desta época, com o desenvolvimento de novas tecnologias e maior aprofundamento em estudos e pesquisas, tornaram-se conhecidas as inúmeras variáveis em todo o processo de cultivo e produção que influenciam no valor nutricional e sensorial desse rico alimento. Ao obter o controle de partes desses processos, passou-se não só a simplesmente extrair, mas também a elaborar azeites, o que faz de sua complexidade aromática a grande descoberta da gastronomia em todo o mundo (vide artigo postado abaixo em 14.11.2013).

O crescimento da oferta de produtos Premium, que se diferenciam dos tradicionais, se observa muito recentemente, portanto.  A marca número 1 em vendas no Brasil, antenada com a nova tendência, está diversificando sua linha de produtos e para 2014 lançará rótulos diferenciados apresentando azeites de complexidade distintas (dos mais verdes aos mais maduros).  Para introduzir tais nuances terá que buscar um caminho essencialmente educacional, uma vez que encontra resistências entre seus consumidores para compreender tais diferenciações.  Será portanto necessário orientar sobre uso, conservação, critérios de escolha e diferenciação de qualidade.  Em se tratando da segunda maior marca de azeites do mundo, é um fato bastante significativo.

O curso da Dra. Brígida Jimenez Herrera, cujos participantes foram em sua maioria profissionais ligados à gastronomia, foi da maior importância para o caminho da consolidação da qualidade dos azeites no Brasil. Um ponto isolado, sem dúvida, mas que somado ao entusiasmo e ao interesse crescentes despertados em todo país, principalmente com as notícias recentes, muito irá contribuir para disseminar essa cultura tão rica e fascinante.

O sucesso do curso evidenciou ao SENAC Rio a necessidade de se oferecer módulos que ampliem e aprofundem o conhecimento a respeito. Por ser assunto ainda desconhecido pela grande maioria das pessoas, inclusive nas áreas tradicionalmente produtoras, onde as pesquisas se multiplicam, tudo o que se fala a respeito gera polêmica, comentários equivocados e acusações improcedentes, inclusive por parte de órgãos fiscalizadores.

O que podemos concluir é que, além do panorama aqui descrito, a forma como se divulgou a pesquisa da PROTESTE, o não cumprimento da Instrução Normativa (em vigor desde setembro/2012) por inúmeras empresas (uma grande distribuidora registrou o índice de acidez como marca e vende assim seus azeites: 0,2 ou 0,3 ou 0,5) e as várias reportagens com informações equivocadas nos levam a conclusão de que esse caminho se faz mais que necessário.  Ele é urgente, urgentíssimo!

Conhecendo os estudos e pesquisas 

Conhecendo o processo de elaboração

Conhecendo sensorialmente no Senac Rio com a Dra. Brígida Jimenez Herrera

Clique no link abaixo para assistir a um video institucional de lançamento

http://paixaoporazeites.com.br/GalloFinal.mp4


14/11/2013

O dia em que ser Virgem se tornou uma fraude.


Em todos os jornais e redes sociais desta semana só se fala nisso, um alarde estranho e exagerado para uma notícias para lá de velha.
Pelo conteúdo das matérias, a Proteste, associação de defesa do consumidor, cumprindo seu papel, recolheu amostras de 19 marcas de azeite rotuladas como extra virgem em supermercados do Rio e de São Paulo e os submeteu a testes químicos e sensoriais.  Os resultados não foram uma surpresa para quem está antenado com as tendências de consumo desse ancestral alimento.

Já em 2009, o escritor norte americano Tom Mueller lançou seu livro Extra Virgindade (vide artigo neste blog postado em 2010), traduzido pela editora Tapioca, no qual denuncia todas as ilegalidades que permeiam o comércio de azeites de oliva em todo mundo.  Um importante alimento, que se tornou uma comoditie como tantos outros, e serve a especulações de preços, onde poucos ficam milionários em detrimento do trabalho de muitos.  O mestre Carlo Petrini há décadas afirma que a origem do alimento, sua produção e distribuição estão em cheque e quando supostas fraudes vem à tona podemos deduzir que são apenas um pequeno sintoma desse complexo e intrigante mundo, tão combatido pelo movimento SLOW FOOD.  Mas voltemos ao Brasil, à Proteste e as matérias dos jornais: dos 19 extra virgens testados, 4 foram considerados lampantes e vale aqui uma correção às nomenclaturas utilizadas nas matérias e artigos:  azeite lampante não é uma mistura de óleos, é uma das classificações do azeite de oliva que não está dentro de parâmetros químicos que o adequam à alimentação humana, daí o nome LAMPANTE dado na antiguidade, pois servia para iluminar.  Quando se detecta a mistura de azeite de oliva com qualquer outra gordura vegetal ou mais de uma, torna-se um óleo composto, o que configura de fato uma fraude.  Sobre as 7 marcas que foram consideradas apenas Virgens nos testes,  acho estranho e  um tanto irresponsável divulgar e colocar cartazes acusando as marcas de fraude, sem antes informar sobre o lote, local de apreensão e a condição de conservação do produto, pois TODO Extra Virgem torna-se Virgem se for exposto a luz e calor por determinado tempo (a temperatura ideal de conservação é entre 16º e 18º C).  Azeites Extra Virgens são perecíveis, alguns são mais estáveis que outros dependendo do percentual de ácido oléico e de anti oxidantes.  Eles não envelhecem como vinhos e devem ser consumidos o mais fresco possível.  Em nosso país tropical, onde há poucas informações para toda a cadeia de distribuição, nas condições que esses produtos são transportados, ficam estocados e são expostos a venda, qualquer excelente Extra Virgem pode se tornar Virgem dependendo de todos esse fatores.  Não saio em defesa de nenhuma das marcas, mas em minha convivência  mais estreita com o estudo e a produção, pude entender melhor as questões da comercialização das grandes marcas industriais e dos Extra Virgens de excelência PREMIUM.  São mundos distintos, porém indissolúveis.  

"A qualidade de um produto pode ser definida como o conjunto de características próprias que permitem apreciá-lo como igual, melhor ou pior que os restantes de sua espécie". (Carpio e Jimenez, 1993).  Já a qualidade regulamentada para azeites de oliva foi estabelecida pelo COI (CONSELHO OLEÍCOLA INTERNACIONAL - www.internationaloliveoil.org)  em 1991 e modificada em julho de 2008.   No regulamento está determinado que quando em um azeite de oliva virgem, um dos parâmetros físico-químicos ou sensoriais não cumpre a norma, este passa a categoria seguinte.  Há um índice global de qualidade que é definido da seguinte forma:  
IC = 2,71 + 0,91 X PO - 0,81 X IA - 9,09 X K270 - 0,025 X IP, onde: IC = Indice de Qualidade; PO = Pontuação Organoléptica, norma COI (panels de degustação); IA = Indice de Acidez; K270 = Absorção ao ultravioleta a 270 nm; IP = Índice de Peróxido.

Minha mestra Brígida Jimenez diz em sua tese: "Este índice permite classificar os azeites de uma forma contínua e mais eficaz.  Não obstante, temos que avançar mais introduzindo outros parâmetros, como a estabilidade, que poderia prever o comportamento do azeite na etapa de comercialização".  Com tanta complexidade nos métodos de classificação, as ações em andamento são estranhamente exageradas.  Se não há manipulação, há desconhecimento!  Ainda que, pela legislação, o fabricante tem o dever de garantir a integridade físico-química do produto até a data de sua validade, sabemos que a desinformação é muito maior que a suposta intenção das ações.  Portanto, não é de hoje que ser VIRGEM não é fraude!

Temos muito o que aprender... Vivemos um grande momento de transição e transformação no consumo do azeite de oliva em todo o mundo, não só no Brasil.  Extra virgens de excelência hoje não são apenas extraídos, são elaborados.  O cultivo, momento de maturação, variedade, clima, otimização da colheita, transporte, tecnologia, tempo de batido, temperatura, decantação, filtragem, armazenagem, todos são fatores que contribuem para características sensoriais distintas, umas controladas, outras mistérios da natureza.

Bons azeites, portanto, não podem ser baratos!Para serem baratos, são menos estáveis e mais sujeitos ainda às variações físico-químicas.  Ao se tornarem virgens, não possuem mais o mesmo valor nutricional, pois estão mais oxidados, mas nem de longe poderão prejudicar à saúde (há azeites que são elaborados propositalmente nesta classificacão) e, portanto, não há motivos para as ações passionais que estamos testemunhando.  

Cabe, a quem interessar possa, informar-se melhor sobre esse rico alimento funcional e entender que seu valor está diretamente ligado à sua riqueza nutricional e suas nuances sensoriais, incomparáveis a qualquer outra gordura vegetal.   Azeite Extra Virgem é qualidade, estilo de vida !  O único caminho é educar para conhecê-lo sensorialmente, descobrir os atributos que caracterizam sua qualidade e fazer sua própria escolha.  Como em tudo na vida!


 Conhecer

Uma cultura


08/11/2013

Dicas para se apreciar o azeite de oliva extra virgem


Uma vez que o mundo inteiro, não só nós brasileiros, está aprendendo a degustar e consumir azeites extra virgens, vale a pena saber algumas dicas para desfrutar caminhos sensoriais que provocam emoções inusitadas, surpresas indescritíveis e sutilezas poéticas que só um alimento ancestral e sagrado pode apresentar.

Hoje, com cada vez mais variedade de rótulos oferecidos nas prateleiras e com preços diferenciados, a grande dúvida que temos é quais critérios adotar para a escolha do produto.  No Brasil, não sei precisamente por quais motivos, o mais utilizado para a decisão final da compra, depois do preço, é a famosa acidez, que no azeite é um parâmetro químico que diz respeito aos seus ácidos graxos livres e, portanto, é imperceptível ao paladar.   De uma forma geral, não somos capazes de diferenciar atributos positivos dos defeitos, por uma simples questão de desconhecimento dos mesmos e nos guiamos por nossa intuição ou por hábitos de consumo que, em muitas ocasiões nos fazem interpretar como positivos alguns defeitos tradicionais presentes em nossa memória sensorial.  Dessa forma, inicie-se nesse mundo usando sempre um extra virgem para finalizar seus pratos.  Discernir sobre a escolha mais correta necessita conhecê-lo um pouco mais sensorialmente, quais os atributos que caracterizam a qualidade e esse é o aprendizado ao qual convido a todos.
Seguem então algumas dicas:

Cor: não é critério de avaliação para os especialistas, seja mais verde ou mais amarelo, mais transparente ou mais opaco, em todos os casos ele pode estar  tanto defeituoso como perfeito.  O copo, no qual o degustador profissional realiza sua análise, é de cor azul para não sugestioná-lo.  No entanto, nas degustações que chamamos de hedonísticas, podemos considerá-lo pelo aspecto que mais nos agrada, do brilhante, transparente ao velado, no caso de serem filtrados ou não.  Do amarelo dourado ao verde mais escuro, dependendo do grau de maturação da fruta.

Aroma: de frutado de azeitona, herbáceo, que lembre algumas vezes o tomate, alcachofra, folhas, ervas recém cortadas ou algo que lhe remeta ao frescor.  De forma alguma deve lembrar-lhe toques acéticos ou avinagrados, ranço ou fermentado. 

Sabor: o amargo e o picante devem estar presentes com equilíbrio, embora este último seja considerado uma textura, vamos aqui pensá-lo como um aspecto do sabor.  Na ausência de ambos, ou com menor intensidade, ele se mostra suave e podemos dizer que é adocicado, pois com tais características é proveniente de azeitonas maduras.  Podemos dizer que a harmonia e a complexidade se dão de acordo com as várias nuances que encontramos, quando nenhuma prevalece sobre outra e, nesse caso, o azeite é considerado elegante.  O que vale saber é que para cada  intensidade distinta vamos aprender a harmonizar com um prato de nossa preferência.

Textura: a fluidez no azeite não é avaliada pelo especialista, sua composição química irá influenciar diretamente nesse atributo, que, para mais ou para menos não caracteriza qualidade ou defeito.  Mas, da mesma forma que a aparência, numa degustação hedonística, podemos avaliá-lo como mais fluido, aquoso, untuoso e sedoso e o gosto de cada um determinará o que considera melhor.
O fato é que para além de todas as nuances que um azeite pode trazer às nossas preparações culinárias, ele é um alimento funcional com valores nutricionais incomparáveis, não encontrados em nenhuma outra gordura, seja animal ou vegetal.  Tomar todos os dias uma colher de sobremesa em jejum pela manhã ou consumi-lo regularmente nas refeições irá prevenir inúmeras doenças, principalmente as cardíacas e as que se originam de alterações das taxas de colesterol e açúcar, apenas para citar alguns benefícios.  Bons extra virgens agem no sistema digestivo e ajudam na absorção alimentar e, por consequência, são indicados para dietas de emagrecimento.  Portanto, sem culpas, consuma-o generosamente e lembre-se, guarde-o longe da luz e do calor e uma vez aberto, em nosso país tropical, não deixe que dure mais que 30 dias.

No mais, consumir azeite é um brinde a vida e à saúde!  Seu corpo sempre agradecerá e sua alma se contentará!


 Na produção do Oro Bailén, uma das excelências do mundo.

 O frecor do momento da extração

As cores

Fonte: Manual de Cata y Maridaje del Aceite de Oliva
Uceda M., Aguilera MaP., Mazzucchelli I.

21/10/2013

Caminhos Sensoriais do Azeite: Andaluzia, Marrocos e Brasil


Desde que cheguei na Andaluzia para o curso de Elaiotecnia no IFAPA – Venta Del Llano, hospedado no alojamento estudantil da Universidade de Jaén, encontro-me cercado de olivais até onde minha vista alcança e além...
Como bolsista desta renomada instituição de pesquisa e formação profissional, aprofundo-me no conhecimento da produção e análise sensorial do azeite de oliva, do qual esta província é a maior produtora mundial.
Cultura fascinante e milenar, minha curiosidade para ultrapassar fronteiras cresce a cada dia em que me dedico mais ao estudo e pesquisa desse ancestral alimento.  Movido por isso e instalado a 310 km do porto de  Algeciras, de onde as embarcações partem rumo à cidade de Tanger no norte do Marrocos, lancei-me a aventura de atravessar o Estreito de Gibraltar para conhecer o quinto maior produtor de azeites do mundo.  Digo aventura, pois as informações que os espanhóis me deram a respeito da viagem eram variadas e imprecisas. 
Acompanhado do único brasileiro que está aqui realizando o curso comigo, Guajará Oliveira, olivicultor gaúcho pioneiríssimo no Brasil, pensei que iria degustar azeites de excelência e lançar meu olhar sobre paisagens exóticas, pois visitar um país árabe sempre permeou meus sonhos de viajante.
Partimos na sexta-feira de tarde, logo após o fim do curso e cinco horas depois estávamos dentro da embarcação para uma travessia de 75 km, com duração de 1 hora e meia.  Controle de passaporte feito a bordo, dirigimo-nos ao deck para apreciarmos o belo por do sol no encontro entre os dois continentes.  O fascínio ali se iniciava, se concretizava num belo instante, mas não imaginei que logo se encerrava.  Desembarque realizado, teve início aquela impressão de que todo o tempo alguém quer lhe enganar e pude experimentar a sensação que um turista desavisado chega à Cidade Maravilhosa, seja por ar, terra ou mar...  quando todo os espertos querem tirar proveito daquele que desconhece onde pisa! 
Não entrarei em detalhes sobre traslado do porto ao hotel, hospedagem e  outras  características que bem conhecemos de cidades que se caracterizam por tirar vantagem em tudo do viajante.  A diferença marroquina para o nosso Rio de Janeiro, neste quesito, é que paga-se bem menos pelo mal serviço, rouba-se com mais ingenuidade, me parece.
Gastronomicamente falando, posso dizer que comi muito bem nos lugares onde fui, ignorando as questões de higiene a olhos vistos: couscous marroquino, que obviamente não poderia deixar de experimentar, e um frango ensopado com limão siciliano em conserva de sal com especiarias, incrível!  O inesperado foram os azeites,  para mim muito ruins, por toda a parte, fermentados, rançosos, avinagrados, adocicados como eles gostam e com os quais foram habituados ancestralmente a consumir.  Tais azeites não fazem mal, dependendo do nível de oxidação e tive aqui um grande aprendizado, pois agradam a muitos consumidores e há reflexões a fazer como cozinheiro.  Tais características estão muito presentes nos “extra virgens” que circulam no Brasil, a informação a ser dada é que esses azeites não possuem os valores nutricionais que o tornam um dos maiores alimentos funcionais que temos a nossa disposição.  A educação sensorial, portanto, torna-se essencial e esse é o caminho que estamos percorrendo agora em nosso país, afim de cada um possa fazer seu discernimento.  Penso sempre nisso!
Azeites a parte, no dia seguinte a nossa chegada, deu-se o choque cultural com o qual não contava...  Homens de mãos ou braços dados, mulheres de cabeça coberta ou de burka, apenas com os olhos de fora, cafés lotados e enfumaçados apenas com homens ocupando as mesas, rindo, conversando e assistindo futebol.  Obviamente, tenho informações suficientes sobre a cultura mulçumana, mas o meu espanto foi com a mais absoluta ausência de gestos amorosos, delicados e gentis...  Tudo estranho aos meus olhos!
A arquitetura exuberante da antiga Medina, das Mesquitas e do centro histórico de Tanger evidenciam um passado de cultura rica e diversificada, mas hoje decadentes, ocidentalizadas na bestialidade do consumo desenfreado e arraigados a tradições opressoras entre os gêneros aos quais tive a mais absoluta rejeição.
Em minha reflexões, esforço-me para não fazer nenhum juízo de valor, pois dois dias e duas noites num país não são suficientes para conhecê-lo, foi apenas uma impressão sobre uma cultura oposta num sentido e semelhante em outro.
Oposta apenas na moralidade abusiva com que as mulheres são tratadas, onde a vestimenta é só um símbolo, quando em nosso país  a nudez feminina é explorada como uma burka às avessas, tornaram-se objeto e a ausência da moral e da ética é senso comum.  Os comportamentos distintos, para ambas as sociedades, são apenas a ponta de um iceberg que daria para ser descrito antropologicamente em páginas e mais páginas, uma vez que a ânsia do consumo bestial é denominador comum entre todos.
O fato é que é nosso assunto é azeite, é dele que eu tenho que falar e nesse caminho sensorial encontro surpresas inesperadas.  Agradáveis ou não, fazem parte da minha escolha, dele tiro lições e profundos aprendizados sobre a natureza humana.  E venhamos, nossas percepções organolépticas estão diretamente ligadas a forma como percebemos o mundo e de uma coisa eu tenho certeza, estamos mudando... temos que mudar... e só pode ser para melhor!





30/09/2013

Uruguai, novo membro do COI e seus novos azeites


Desde que escrevi o último artigo aqui postado, já havia escolhido o tema acima, pois, além de saber da recente inserção do Uruguai como país membro do COI no ultimo dia 20 de agosto, iniciava a seleção dos azeites uruguaios que irão compor a Carta de Azeites do Gonzalo, excelente restaurante de "Parrillas", cuja cozinha é comandada pelo querido Chef Dudu Mesquita, um dos sócios do empreendimento inspirado na gastronomia uruguaia.
Segundo menor país sul americano, depois do Suriname, com pouco mais de 3,5 milhões de habitantes, possui um clima temperado que favorece a formação de inúmeros terroirs.  Oficialmente conhecido como República Oriental do Uruguay, é um dos países mais desenvolvidos economicamente da América do Sul e o primeiro em qualidade de vida e desenvolvimento humano.  Seu presidente, José Mujica é considerado, segundo a revista Forbes, o presidente da república mais pobre do mundo.  Agricultor, foi  ministro da pecuária, agricultura e pesca, doa 90% de seu salário de U$12.500 e anda de fusca.  Pepe Mujica, assim é popularmente conhecido, faz de sua vida um exemplo do "ser político" antenado com as necessidades do novo tempo e suas atitudes deveriam ser seguidas por todos os lideres mundiais.
Como as ações das classes políticas permeiam as camadas sociais do país por elas representado, o Uruguai evidencia na qualidade de seus produtos e serviços, seu ambiente político justo, anos luz de distância do que vivemos no Brasil.
Dos vinhos aos azeites, da carne ao doce de leite, dos indicadores sociais à excelente hospitalidade, nosso país descobre o seu pequeno vizinho e temos sido destino de seus bons produtos.  
Família Deicas, DelaSierra, Lote8, Olivar Del Virrey, Punta Lobos, esses são os nomes dos excepcionais rótulos de extra virgens que chegam às nossas prateleiras e que irão compor a carta do "Gonzalo".  Com intensidades de frutado distintas, monovarietais ou blends, cada um apresenta uma nuance sensorial que irá harmonizar com as excepcionais criações do Dudu, que compõe o menu Gonzalo, das entradas às sobremesas.
Qualidade é um atributo subjetivo que pode variar pela percepção de cada um, e, segundo Ishikawa, um teórico japonês que implementou os primeiros programas de qualidade no pós guerra do Japão, ela se inicia e termina com a educação.  Para que se possa percebê-la em sua totalidade, principalmente no que concerne a gêneros alimentícios, é preciso conhecer os atributos que a caracterizam e a transmissão de tal conhecimento é um grande desafio.
Estou a bordo do avião que me leva aos olivais da Andaluzia, chego à Jaén na tarde do dia 30 de setembro, quando postarei este artigo.  Do dia 1 de outubro até o dia 31 estarei imerso no estudo da Elaiotecnia.  Do cultivo das oliveiras à extração, produção, elaboração e percepções sensoriais dos azeites e azeitonas de mesa, o quanto cada etapa e fator dessa cadeia produtiva está relacionada com a qualidade e como a percebemos.  Esses são os assuntos com os quais estarei totalmente envolvido nos próximos 35 dias.   
Assim, sobre as asas do Voo TAP 078, meu sonho e utopia tomam forma... Para além de todos os significados que a cultura da oliveira representa, ser um transmissor de todo esse conhecimento me move apaixonadamente.

Do Uruguai, Chile, Argentina, Portugal, Espanha ou Itália e até mesmo Brasil e outros países produtores, azeite extra virgem é alimento ancestral, rico em saberes e sabores, que faz do ato de cozinhar e de comer, um ato tão sagrado quanto nobre, tão rico e diverso quanto a vida que pulsa incessantemente no universo. A dimensão de tudo isso está para ser medida, mas já podemos senti-la!

Terroir Uruguaio


Gonzalo, no Leblon

31/08/2013

Rio Gastronomia, Babette & Azeites Extra Virgens


O mês de agosto, que terminou, foi sensivelmente o mais azeitado que já tivemos notícia em nossa cidade.   Do Rio Gastronomia, evento promovido anualmente pelo jornal O Globo, tivemos palestras, aulas, harmonizações e estande de degustação.  
Entre os dias 15 e 18 desse mês, o azeite "GALLO", um dos principais patrocinadores do evento, ofereceu para degustação sua linha diferenciada de quatro azeites, todos muito bons e dentre eles, um azeite de primeira colheita, com evidente frutado verde, fresco, de sabor marcante que em nada lembra aquele azeite tradicional  de nossa memória afetiva.  
A iniciativa da marca atende a uma crescente demanda do consumidor pela qualidade, cujos parâmetros que a caracterizam tem sido difundidos cada vez mais, assim como as informações sobre a diversidade de seu uso, objetivo maior de meu trabalho.

Na semana seguinte aos dias do Circuito, no dia 20 realizamos a terceira edição de "BABETTE, Comida, Diversão e Arte", projeto de Rodrigo Cotrim (COLETIVO GOURMET), que promove diálogos sensoriais entre comida e arte... Contadores de história, músicos, cantores, atores, cozinheiros, todos juntos e misturados!
Nossas percepções atentas aos aromas, sabores, histórias... De azeites, especiarias, temperos! 
Das crocâncias e altitudes do Peru, país homenageado da edição, aos sabores das lendas deliciosamente contadas e cantadas pelos  Contadores de histórias peruanos (Rosana Reátegui e Edison Mego).

Com a nobre missão de harmonizar extra virgens com as criações da Chef Ana Salles, fiz uso do brasileiro OLIVAS DO SUL, Monovarietal Arbequina e dos Uruguaios Olivar del Virrey e De la Sierra, Monovarietal Picual.  
O Peru se tornou recentemente, assim como o Brasil, um país produtor com qualidade já reconhecida, mas como não tive acesso a estes a tempo, optei por países irmãos, ambos novos produtores.  
Os *azeites extra virgens uruguaios entram mostrando qualidade, frescor e complexidade para harmonizar com os mais variados pratos e o blend Olivar del Virrey, aromatizado com limão siciliano finalizou com perfeição o pudim de aipim e coco com calda de melado e especiarias da Chef.
As emoções se azeitaram nesta noite sensorial e a comida se faz arte, a arte alimentou a alma e dali saímos regozijados.

Além desses eventos, o SENAC RIO, do qual sou docente, ofereceu atividades em algumas unidades, na qual o azeite foi protagonista e o agito, intensidade e interesse pelas ações me levaram a vários aprendizados.  A complexidade sensorial do azeite é de fato fascinante, descreve, além de sua enorme riqueza nutricional, um histórico significado, uma magia ancestral e a poesia de sua terra de origem. A transmissão desse conhecimento, que aprendi a reconhecer em aromas, sabores e untuosidades é evidentemente subjetivo, lúdico e por isso mesmo humaniza, traz paz!   
Que bom são esses caminhos... Estamos mesmo precisando!




A entrada do Circuito Rio Gastronomia

                                      
Aulas do Senac Rio no Jóquei Clube

Azeitados de Limão servidos no estande de degustação


                        Aula sobre azeite e harmonização no Circuito Rio Gastronomia