24/02/2014

Brasil, um assalto no Aterro, a oliveira e o azeite...

No dia 5 de dezembro do ano passado, pedalando em meu caminho para casa, após encontro com Dra. Brígida Jimenez, fui atacado por três jovens na saída do Aterro do Flamengo, que me derrubaram no chão, me agrediram e ameaçaram para roubar uma bicicleta elétrica, meu principal meio de transporte em nossa caótica cidade.  Devido a queda e à agressão, fui hospitalizado naquele início de tarde, quando me preparava para o penúltimo dia do Curso Superior de Análise Sensorial de Azeites de Oliva, ministrado na ocasião pela Dra. Brígida na unidade Copacabana do Senac Rio, curso esse objeto de um artigo aqui postado em 17 de dezembro, no qual evitei citar o incidente.  O fato resultou em uma ruptura total de um dos tendões que compõe o complexo articular do ombro direito e para o recompor fui submetido a uma cirurgia no dia 17 de janeiro, cuja dolorosa recuperação está em curso.

Indignado, esforço-me para me recuperar psicologicamente da violenta agressão e fisicamente da lesão e da cirurgia, refletindo sobre a complexa situação social que vivenciamos há décadas, particularmente no Rio de Janeiro e que, nesse momento de "crescimento econômico", encontra um inigualável pico de tensão.

Escrevo essse simples artigo, despindo-me da pretensão de realizar qualquer análise política ou sociológica desta realidade, mas para expurgar minha indignação e revolta!  Os fatos tornam evidente a crescente crise ética e moral, onde valores elementares para a vida encontram-se no mais absoluto desuso e, consequentemente, testemunhamos no cotidiano as mais bizarras, surreais e inacreditáveis cenas de desrespeito a princípios básicos de convivência social.    

As oligarquias do poder no Brasil tiverem em sua formação histórica o clientelismo, o fisiologismo e o corporativismo, terreno onde a corrupção viscejou, cresceu e permeou todos os estratos sociais, ao ponto em que hoje a banalizamos, testemunhamos e praticamos quase sem nos dar conta, tamanho o enraizamento e aculturamento.

O que temos observado agora é a radicalização de pensamentos que evidenciam uma sociedade fragmentada, violenta, inculta, deseducada e que busca seu caminho de redenção em uma política de ganhos sem escrúpulos, consumo sem sentido, inconsequente, inconsciente e na mais completa ausência de valores que dignifiquem a vida como um todo.

Ao iniciar meus estudos e pesquisas com Azeite de Oliva em 2008, as constantes análises sensoriais desse ancestral e sagrado alimento criaram em mim uma consciência crítica sobre essas complexas relações e tornei-me convicto de que minha missão como educador é despertar as percepções sensoriais de cada um e através destas resgatar a relação com o alimento, sua importância, sua origem, reaprendendo a escolhê-lo, a prepará-lo, a degustá-lo.

Atuando como Ecochef do Instituto Maniva, estudioso da origem alimentar e educador profissionalizante em gastronomia, busco dar às minhas palavras e ações um sentido maior que possa influenciar e transformar tal circunstância.  

No Maniva temos a missão de "agregar valor aos agricultores familiares do Brasil, favorecendo a manutenção da biodiversidade e a melhoria da qualidade alimentar das sociedades rurais e urbanas".  No árduo caminho desse empreendimento, que me aproximou do universo da produção alimentar, ficou claro o quanto a sociedade quebrou em algum momento de sua história o vínculo com o alimento e sua origem.  Em tempos de tanta abundância e fartura, vivemos o período de maior privação sensorial da história da Humanidade, fator que seguramente está ligado a violência endêmica que nos atinge.
Precisamos recriar esse elo... O tempo de preparar o alimento e se nutrir são da maior importância, são ações que nos tornam humanos.  O sentar-se a mesa para uma refeição é um momento sagrado, fórum de diálogo, de unidade, de confraternização, de relaxamento, de prazer pela vida!

Voltando à minha indignação, o fato é que todos os acontecimentos que nos cercam não nos tornam vítimas de nada, somos responsáveis direta ou indiretamente por todos eles e cabe unicamente a nós transformá-los.  A grande mudança se inicia em nossa mente, no que pensamos, no que falamos, em como agimos.

Não nutro ódio por quem me atacou e me feriu, penso apenas no que devo fazer a partir de agora e percebo que o caminho que sigo, trabalhando com o alimento, como educador e divulgador da cultura do azeite é o que me encoraja a seguir em frente a despeito de todas as adversidades.

Falando de azeites, a oliveira, cujos frutos o produzem, é símbolo de paz e de unidade entre os povos.  Sua imagem está associada à longevidade, à esperança, à vitória, à força e à fidelidade.  Na Grécia Antiga era consagrada a Palas Atenas e a Zeus.  Para os povos islâmico, judeu e cristão a oliveira é considerada sagrada, simboliza a presença de Deus entre os seres humanos.  Na Ásia Menor era considerada um distintivo de prosperidade, de proteção pacífica e benevolente dos Deuses.
Caminho de tanta simbologia, não o escolhi por acaso, agora, mais que nunca encontro as inúmeras razões... Enfatizar o valor nutricional desse rico alimento é obrigação,  falar de seu valor lúdico e simbólico, encontrado em suas nuances sensoriais é a poesia que precisamos  para alimentar a alma, encontrar razões de ser, de se reerguer, de amar e de seguir em frente.  Um brinde a vida... com AZEITE!

 Uma oliveira carioca...

 Paz

Ouvindo conselhos milenares